Anos de chumbo
União é condenada a reparar
vítima de estupro na ditadura
A União foi condenada a reparar
uma mulher vítima de estupro durante o regime militar de 1964 em R$ 100 mil. A
decisão é da 3ª Turma do Tribunal Regional da 4ª Região, que confirmou sentença
da Justiça Federal de Cascavel (PR). Ainda cabe recurso.
Filha de um líder partidário da
oposição, ela tinha 16 anos quando foi violentada por um soldado do Exército na
propriedade da família, ocupada por militares que queriam capturar seu pai.
De acordo com a ação, o crime foi
cometido durante o movimento do chamado "Grupo dos 11", que partira
do Rio Grande do Sul com destino a São Paulo em protesto contra a ditadura
militar. A identidade do soldado é desconhecida. Sabe-se, no entanto, que ele
integrava o contingente militar sediado em Leônidas Marques (PR), cuja missão
era barrar o grupo.
O valor da indenização deverá ser
acrescido de correção monetária e juros de mora de 0,5% ao mês, contados a
partir da citação. De acordo com o voto da desembargadora federal Silvia
Goraieb, acompanhado pela maioria dos integrantes da 3ª Turma, o pedido de
indenização está previsto no artigo 37, parágrafo 6º da Constituição Federal.
O dispositivo estipula que as
pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus agentes,
nessa qualidade, causarem a terceiros. Para Silvia, a União não conseguiu
provar que o fato não teria acontecido, limitando-se a informar através de
ofício não existir "qualquer registro sobre o suposto ocorrido".
Como o fato aconteceu em um
período de intensa censura e repressão política, destacou a desembargadora,
"seria temerário que a autora procedesse ao registro de queixa em qualquer
órgão policial civil, bem como uma verdadeira insanidade se o tivesse feito
perante órgãos militares".
Assim, segundo Silvia, não é
estranho a ausência de prova documental do delito. "Somente os tempos de
hoje oferecem as necessárias condições de segurança para que determinados fatos
venham à tona e sejam reparados", afirmou.
Também não foram refutadas pela
União, destacou a desembargadora, as afirmações de que o pai da vítima era
perseguido político e de que soldados estiveram na região para capturar pessoas
tidas como opositoras ao regime. Silvia lembrou que tramita no Ministério da
Justiça um pedido de declaração de anistiado político feito pelo pai da autora.
Além disso, não há contestação
quanto às pesquisas históricas referidas pela sentença da Justiça Federal de
Curitiba, "que confirmam a presença do Exército Brasileiro nos locais
noticiados". Finalmente, Silvia considerou que a prova oral não deixa
dúvidas de que a autora foi vítima de estupro, "que seus gritos foram
ouvidos à distância e atraíram a atenção de dois depoentes, os quais saíram
correndo para socorrê-la".
Para a desembargadora, a dor e o
sofrimento vivenciados até hoje pela autora dispensam comprovação. "Não é
crível aceitar que alguém possa passar por uma experiência desse porte sem
sofrer abalos emocionais".
Processo 01062005.doc
Revista Consultor Jurídico,
2 de junho de 2005




























